quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Desse jeito...

Após alguns longos minutos de silêncio, ele perguntou, espantado com a própria pergunta:

- Por que você faz assim?
- Assim como?
- Oras, assim, desse jeito.
- Como assim?
- Desse jeito que você faz!
- E como faço?
- Hum, é... é... é desse jeito seu.
- Jeito meu?
- Jeito seu de fazer, ué!
- Hum... assim desse jeito?
- É, assim, parecido com o que você parece ser.
- Pareço ser desse jeito?
- Sim, um pouco assim, um pouco assado.
- Ah tá, pensei que você estivesse falando de um jeito único. Jeito soberano de ser.
- Então, é isso.
- Isso o que?
- Não sei.
- ...
- Talvez eu estivesse querendo falar do meu jeito, não do seu.
- ...

Silêncio. Ele muda o jeito de cortar a carne.
Ela continua descascando as batatas. Do mesmo jeito.


(acho que ando inspirada por Clarice...)

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Obrigada, Senhor!

Post atípico hoje.
(me perdoem, preciso desabafar).

Estava eu ontem, quase me preparando para sair do escritório, quando me passam uma ligação. Até falei, antes mesmo de atendê-la - acho que já ativando o meu sexto sentido: a Camilla não está!, brincando, claro, mas a ligação, obviamente, foi passada.
- Camilla, você é responsável pelo cliente X.
- Sim, o que precisa?
- Então – mascando chiclete com a boca aberta, fazendo aquele barulho irritante - preciso que me dêem uma entrevista amanhã sobre o assunto Zanski. Aliás, que projeto é esse?
Eu pensando comigo mesma: como assim que projeto é esse???? O cara pede entrevista sobre o assunto e não sabe nem sobre o que é?!?!?!?
Respirei fundo e expliquei detalhadamente como funciona, os envolvidos, os beneficiados e por aí vai.
- Você pode me mandar por e-mail isso?
- Claro! – sendo super prestativa.
- Você tem contatos dos beneficiados?
- Sim, te mando em anexo no e-mail, e você pode entrar em contato diretamente com eles enquanto eu vejo se o fulano de tal pode te dar entrevista amanhã, mas, como você me ligou muito tarde, não posso lhe garantir que ele atenderá a sua pauta. Assim que tiver uma resposta dele, eu te ligo de volta, ok?!
- Fechado!
Desliguei o telefone, montei um e-mail anexando tudo o que ele tinha pedido e mandei um simpático: Qualquer dúvida, me ligue (ah, se arrependimento matasse!).
5 minutos depois, me repassam uma ligação.
- Camilla?
- Eu!
- É o fulano de tal, será que você não poderia me passar pelo menos os telefones dos beneficiados.
- Mas eu já te passei tudo direitinho, já olhou seu e-mail depois que falou comigo?
- Hum, ainda não, vou dar uma olhada então.
Tsc Tsc Tsc. Assim fica difícil.
E o telefone toca novamente.
- Camilla?
- Oi, fulano! – já respirando bem fundo.
- Você já tem alguma resposta?
- Fulano, só passaram 15 minutos do momento que você me ligou pela primeira vez e fez essa solicitação. Avisei que estava tarde, mas já deixei um recado no celular da pessoa que pode atender essa pauta. Agora precisamos esperar, pode ficar tranqüilo, EU te dou retorno.
- Hum – um exagerado bocejo que quase me fez desligar na cara dele – me diz uma coisa, cadê os contatos dos beneficiados? Isso não chegou para mim.
- Olha fulano, você pode dar uma olhada no e-mail que te mandei? Mandei em anexo dois arquivos, um deles tem o contato de todos, com telefone, endereço, cep, valor do benefício....
- Ah, olha só, não é que veio mesmo, mulher?
(ãhn???? Agora virou meu melhor amigo!)
- Pois então, quando eu tiver resposta do porta-voz, EU te ligo.
5 minutos depois, estava eu procurando uma informação para um colega de trabalho que está viajando com outro cliente, e o telefone toca.
Já estou sozinha no escritório, falando na outra linha com o coleguinha, não deu tempo de puxar a ligação. Mas não teve problema, o fulano ligou no meu celular na seqüência.
- Camilla?
- Oi...
- Então, já tem resposta?
- Não.
- Hum.
- Mais alguma coisa, fulano?
- Hum...
- (respiro profundamente)
- Sabe, esses beneficiados que me mandou, sabe? (-como não saberia????!!!!) – São acessíveis?
- Sim, já deram muitas outras entrevistas.
- Será que você não poderia ligar para eles para saber se eles podem dar entrevista para nós? – mascando insistentemente aquela p. daquele chiclete.
- Olha, fulano, esses contatos devem ser feitos por vocês, uma vez que eles têm total autonomia para atender ou não as solicitações. Caso você TENTE e não dê certo, de jeito nenhum, me avise que tentamos ajudar com o que for possível.
Desligo meu computador, arrumo minhas coisas, vou ao banheiro. Desço.
Esperando meu carro toca meu celular. Número Privado. Atendo já bem sabendo quem é.
- E aí, Camilla, tudo certinho?
- (eu, sem o menor esboço de emoção) Sim.
- Resposta?
- Não.
- Vai ter uma logo?
- Não sei.
- Como assim?
- Como já disse, não depende mais de mim.
- Hum, sabe o que é, ele não mora em São Paulo, né?
- Oi?
- Procurei por ele na lista telefônica e nada.
- Fulano, já entrei em contato com ele e já falei que assim que conseguir qualquer resposta, seja positiva ou negativa, EU ligo para você assim que desligar com ele.
- Hum, você entende que eu preciso dessa resposta, né?!
- Sim, e você entende que eu não tenho como lhe dar uma resposta sem que ele me retorne, né?
- Sei, sei, mas eu preciso de uma resposta.
- Eu sei, mas, infelizmente, não tenho nenhuma ainda. Obrigada.
Desliguei. Respirei fundo e coloquei uma música bem alta.
Enquanto falava com meu namorado, 3 ligações Privadas perdidas e uma de um outro número qualquer.
Desligo com ele e toca novamente daquele mesmo número qualquer.
- Camilla?
- Oi.
- E aí?
- Olha fulano, acho que talvez eu não esteja me expressando bem, pois essa já é a quinta ou sexta ligação que eu digo a mesma coisa para você, mas, mesmo assim, você continua insistindo com a mesma pergunta. Acho que talvez seja um problema de comunicação meu. Não, ainda não tenho resposta, uma vez que se já a tivesse, certamente você também a teria.
- Então, é que eu preciso dela.
- Ahãn.
- É que é meu trabalho deixar a pauta de amanhã pronta.
- Também é o meu te dar um retorno.
- Então?
- Então, até amanhã. Muito obrigada.
Sim, ele já me ligou hoje. E adivinhem? Eu ainda não tenho resposta.

Obrigada Senhor, por me ajudar a ser um pouco mais tolerante nessa vida.
Prometo que serei uma boa menina e não jogarei uma bomba de bosta atômica na cabeça dele nas próximas horas, uma vez que, mesmo sendo retardado desse jeito, ele pode ter família e pessoas que podem sentir a falta dele (duvido, mas continuo nas prestações do financiamento do meu pedacinho no céu, então...).
Amém.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Idéias

E daí vem o turbilhão de idéias.
Idéias soltas, idéias prontas, idéias zinhas.
A cabeça dói, a pele arrepia, o sossego não faz parte.
Vem o presente, vem o futuro, vem o que há de ser.
O que se quer ser.
O que não se sabe ainda ser.
Vem a certeza, vem a dúvida, vem a preguiça.
Palavras soltas, cores sobrepostas, foco desfocado.
Ideais. Idéias.
O que fazer com elas?

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Ler, ler, ler, ler

Venho pensando, trabalhando, degustando, repensando, me questionando e tantas outras coisas sobre a importância da leitura na vida das pessoas. Desde pequena devoro livros, confesso que nos últimos tempos bem menos do que deveria, com uma paixão que nunca se cansa de existir. Não posso entrar em livrarias. Tenho quase que um tique nervoso de ler trechinhos aqui e acolá.

Minha atenção aos livros aumentou e muito depois que comecei a trabalhar com o Instituto Ecofuturo, que além de me proporcionar algumas boas horas de risadas em reuniões nas quais as idéias nascem a cada milésimo de segundo e os e-mails se multiplicam em minha caixa de entrada quase que de uma maneira viral, tem me pegado pela mão e me apresentado milhares de coisas desse mundo da leitura que antes, confesso, eu não prestava tanta atenção. E, pronto, tenho amado cada vez mais este tema.

Ontem, tive o imenso prazer de estar presente na abertura do 3º Corredor Literário de São Paulo, em uma homenagem ao bibliográfo, imortal e tantas outras milhares de coisas boas, José Mindlin. Apesar das discrepâncias de uns, que não podem ver um microfone em um espaço público para dar início ao show de horror de nosso vago discurso político, a homenagem foi linda. José Mindlin e sua fantástica gravata com desenho de prateleiras de livros, aos 92 anos, emocionante lucidez e bom humor, é uma das figuras mais importantes da luta pela educação de qualidade no país.

Teria mais um milhão de coisas para dizer hoje por aqui, mas o tempo é curto e o turbilhão de idéias que se formam em minha cabeça não me permitem organizar muito bem um discurso que não seja confuso, nem muito menos vago. Precisava apenas colocar para fora um pouquinho do carinho e motivação que trabalhar com o tema Leitura, e Escrita, tem me causado.

Ontem também, Lima Duarte fez uma Leitura Dramática por lá de Guimarães Rosa e de Drumonnd, o que me provocou arrepios deliciosos. E deixo aqui um dos textos lidos majestosamente por ele:


BIBLIOTECA VERDE

Papai, me compra a Biblioteca Internacional de Obras Célebres.
São só 24 volumes encadernados em percalina verde.
Meu filho, é livro demais para uma criança.
Compra assim mesmo, pai, eu cresço logo.
Quando crescer eu compro. Agora não.
Papai, me compra agora. É em percalina verde, só 24 volumes.
Compra, compra, compra.
Fica quieto, menino, eu vou comprar.

Rio de Janeiro? Aqui é o Coronel.
Me mande urgente sua Biblioteca bem acondicionada, não quero defeito.
Se vier com um arranhão recuso, já sabe: quero devolução de meu dinheiro.
Está bem, Coronel, ordens são ordens.
Segue a Biblioteca pelo trem-de-ferro, fino caixote de alumínio e pinho.
Termina o ramal, o burro de carga vai levando tamanho universo.
Chega cheirando a papel novo, matade pinheiros toda verde.

Sou o mais rico menino destas redondezas.
(Orgulho, não; inveja de mim mesmo)
Ninguém mais aqui possui a coleção das Obras Célebres.
Tenho de ler tudo.
Antes de ler, que bom passa a mão no som da percalina,
esse cristal de fluida transparência: verde, verde.
Amanhã começo a ler. Agora não.

Agora quero ver figuras. Todas.
Templo de Tebas. Osíris, Medusa, Apolo nu, Vênus nua...
Nossa Senhora, tem disso nos livros?
Depressa, as letras. Careço ler tudo.
A mãe se queixa: Não dorme este menino.

O irmão reclama: Apaga a luz, cretino!
Esparmacete cai na cama, queima perna, o sono.
Olha que eu tomo e rasgo essa Biblioteca antes que pegue fogo na casa.
Vai dormir, menino, antes que eu perca a paciência e te dê uma sova.
Dorme, filhinho meu, tão doido, tão fraquinho.

Mas leio, leio.
Em filosofias tropeço e caio,
cavalgo de novo meu verde livro,
em cavalarias me perco, medievo;
em contos, poemas me vejo viver.
Como te devoro, verde pastagem.
Ou antes carruagemde fugir de mim e
me trazer de volta à casa a qualquer hora
num fechar de páginas?

Tudo que sei é ela que me ensina.
O que saberei, o que não saberei nunca,
está na Biblioteca em verde murmúrio
de flauta-percalina eternamente....

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Adultos... Adultos...



(clique na figura para ampliar ; )!)

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Silêncio

Silêncio...
Ouve-se o som dos tambores do vento

Silênci...
Ouve-se a dança das águas do mar

Silênc...
Ouve-se o sol se escondendo no tempo

Silên...
Ouve-se os grãos de areia correndo pelo ar

Silê...
Ouve-se a lua se aconchegando no espaço

Sil...
Ouve-se os pensamentos fluindo mais lentamente

Si...
Ouve-se histórias de palavras não ditas

S...
Ouve-se as batidas dos corações enamorados

...
Ouve-se a vida pulsando ferozmente
pelas veias.